Projecto Casa do Gelo em Cabo Verde
O Projecto nasce de uma parceria de quase dez anos entre a Câmara Municipal do Porto Novo, AGRIPESCA e Águas de Ponta Preta, Associados da ALER, em que as partes ao longo dos anos têm trabalhado em vários projectos mediante uma união de competências. Esta parceria desenhou o projecto tendo em conta a oportunidade de financiamento junto SGP/GEF e FSST (Fundo de Sustentabilidade Social para o Turismo) que estavam em disposição há dois anos.
O projecto “Reforço do Acesso à Energia Sustentável para Impulsionar Atividades Geradoras de Rendimento em Monte Trigo” é uma iniciativa desenvolvimento local e comunitário com objectivo de empoderamento e reforço das capacidades da AGRIPESCA, Associação Comunitária de Desenvolvimento Comunitário de Monte Trigo através da implementação de conjunto de atividades estratégicas.
Em especial o projecto teve como objectivo o aumento e melhoraria do acesso aos recursos energéticos na Aldeia de Monte Trigo mediante a operacionalização e ampliação da Casa do Gelo através de sistema autónomo de energias renováveis. Traduzido, fisicamente na instalação na Casa do Gelo, de mais 2 máquinas de gelo somando uma capacidade nominal de produção em 24 horas de 1.000 kg (4x250 kg) de gelo e de um sistema de 24 geração e acumulação de energia solar fotovoltaica de 15 kWp. Além das actividades complementares e sinergias desenvolvidas ao longo da sua implementação, que contemplaram acções de formação junto da Associação e das mulheres da aldeia.
Melhoria na qualidade do aprovisionamento do pescado
Desde o dia 18 de Abril a Comunidade de Monte Trigo tem tido acesso ao gelo de forma contínua e previsível, uma matéria prima indispensável para viabilização da atividade comercial das pescas, segurança alimentar e de gestão da biodiversidade local mediante a redução das perdas económicas e de pescado pós-captura. A Casa do Gelo de Monte Trigo, após a obra, conta com um sistema que seguindo um regime de produção, resulta em uma disponibilidade diária de 500 kgs/dia. O gelo é produzido em formato de escamas, adaptando-se as necessidades de conservação de pescados e as melhores práticas.
Partilha das responsabilidades na gestão das infraestruturas comunitárias
A Câmara Municipal do Porto Novo, legítima proprietária da Casa do Gelo, no dia 25 de Agosto transferiu a gestão desta infraestrutura, no quadro projecto, para uma gestão comunitária. A AGRIPESCA assumindo a gestão da Casa do Gelo, tem reforçado a sua capacidade de liderança comunitária, responsabilizando-se com algumas tarefas comunitárias. Esta transferência simboliza uma primeira aproximação a uma abordagem de co-gestão das pescas, fundamental para desenvolvimento do sector em especial na proteção dos recursos ambientais e na garantia dos serviços essenciais, como gelo.
Como as energias renováveis podem contribuir no processo de produção de gelo
Monte Trigo, foi a primeira comunidade abastecida 100% com Energias Renováveis (Projeto SESAM-ER) em Cabo Verde, através da Central Fotovoltaica de Monte Trigo (CFMT), a funcionar desde 2012, atravessa hoje um outro desafio – o do aumento da procura energética, normal com a evolução hábitos do uso de electricidade relacionados directamente com o desenvolvimento proporcionado pela disponibilidade 24/24 de energia eléctrica. A Casa do Gelo entrou em funcionamento em 2014, criada para aproveitar os excedentes de energia da Central Fotovoltaica de Monte Trigo. Após a ampliação da CFMT, a unidade de produção de gelo passou a receber energia de forma normal durante algumas horas do dia, e a não depender dos excedentes gerados. Com o actual projecto, essa unidade ganhou a sua própria autonomia energética, com a instalação de um sistema solar fotovoltaico com baterias, podendo gerir a sua produção mediante as necessidades, aumentar a sua capacidade de produção e ainda a possibilidade de criação de negócios relacionados com a atividade pesqueira.
Dados técnicos do sistema:
- 54 módulos solar policristalino de 275 Wp
- 3 inversores DC-AC de 5.000 W, cada
- 1 inversor de carregador de baterias de 8.000 W
- 24 baterias tipo OPzV de 2.100 Ah (48V)
- 4 máquinas de gelo de 250 kg/dia
O projecto e o desenvolvimento de comunidades vulneráveis através do empoderamento das pequenas associações comunitárias e das mulheres
O projecto teve como um dos financiadores, o GEF SGP através do programa das Pequenas Subvenções do Fundo Mundial para o Meio Ambiente às Organizações da Sociedade Civil que tem potencializado e viabilizado oportunidades de financiamento e de estabelecimento de parcerias para desenvolvimento de comunidades vulneráveis. Este programa tem apoiado o empoderamento de várias pequenas associações comunitárias tanto a nível organizacional e financeiro como também no encontro soluções locais de desenvolvimento.
Foram realizadas acções formativas dirigidas principalmente aos membros da AGRIPESCA, incluindo temas desde Reforço das capacidades associativas; Desafios comunitários e integração na perspectiva de género e Gestão do negócio da Unidade de Produção de Gelo. Os resultados alcançados vão desde um aumento do estreitamento das relações entre os membros e os não membros da Associação, com debates livres e sem constrangimentos sobre os desafios de desenvolvimento comunitário. Da parceria com o IEFP, através de formadores qualificados foi desenvolvido um programa de formação PIN (Planificar, iniciar um Negócio) para 15 mulheres da aldeia de Monte Trigo. Essas mulheres são na sua grande maioria desempregadas à procura de uma oportunidade para iniciar um auto negócio. Como resultado foram concluídos 10 Planos de Negócios, que foram submetidos ao programa de atribuição de kits individuais para início dos seus negócios.
A importância das alianças estratégias no desenvolvimento comunitário
A importância das alianças entre actores é fundamental para viabilização de projectos comunitários. As alianças no quadro do projecto “Acesso à energia sustentável para impulsionar atividades geradoras de rendimento em Monte Trigo” permitiram mobilizar e dinamizar várias fontes de financiamento, realizar a transferência tecnológica e técnica e desenvolver várias acções comunitárias sustentáveis, com resultados positivos no desenvolvimento comunitário, nomeadamente a melhoria das condições do exercício das pescas, reforço da liderança comunitária e empoderamento das mulheres. Resultados que poderiam estar comprometidos e inviabilizados se a actuação tivesse sido isolada. A AGRIPESCA contou com o apoio dos seguintes parceiros: Câmara Municipal do Porto Novo, o GEF SGP, o Ministério do Turismo e Transportes (através do Fundo de Sustentabilidade Social para Turismo), a Águas de Ponta Preta, Lda, o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP).
Lições aprendidas e recomendações
Do processo de implementação do projecto, foi averiguado um conjunto de factos e situações fundamentais e aprendizagens que poderão servir de apoio e maximizar os resultados para futuras iniciativas comunitárias:
- A implementação de um projecto local é uma forma prática de empoderamento das lideranças locais e de mobilização de parceiros estratégicos para a localidade, em especial tecnológicos e financeiros;
- As comunidades locais isoladas como Monte Trigo, através das Associações Comunitárias devem ser incluídas no processo de transição energética, em especial no âmbito dos benefícios fiscais por forma viabilizar o investimento comunitário nas energias renováveis e na criação de comunidades sustentáveis.
- A transferência da Casa do Gelo para uma gestão comunitária é um primeiro passo para a cogestão das pescas na aldeia piscatória de Monte Trigo mediante partilha das responsabilidades públicas com comunidade na gestão das infraestruturas das pescas.
- A criação de uma rede de parceiros privados e públicos é fundamental para o desenvolvimento comunitário, em especial, no âmbito da transferência técnica e tecnológica.
- O acesso à energia nas comunidades isoladas e afastadas mediante energias renováveis além de ser viável, serve também para erguer localidades sustentáveis e autossuficientes.
- A implementação dos projectos locais é fundamental para o envolvimento de todos os membros da comunidade, em especial das mulheres garantindo a apropriação comunitária e individual da iniciativa e do comprometimento de todos no desenvolvimento comunitário.
Os contributos a nível da penetração de energias renováveis em Cabo Verde
Monte Trigo, uma das aldeias mais afastadas e isoladas de Cabo Verde, com 275 habitantes (INE-Censo 2010), através da sua micro rede de Central Fotovoltaica de 39,3 kWp, instalado em 2012, contribuiu com a produção de mais de 300 MWh de energia eléctrica até a actualidade, poupou a utilização de 87.000 litros de combustível de origem fóssil e evitou a emissão de 261 toneladas de CO2 para a atmosfera.
O sistema solar fotovoltaico ora instalado que veio somar na micro rede abastecida 100% com energias renováveis contribuem, embora que simbolicamente, no aumento da penetração das Energias Renováveis em Cabo Verde, contribuindo também para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Fonte e Imagem © APP